quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

Calouro é bicho?



No início do ano letivo, além das inúmeras notícias relacionadas ao tráfico, assassinatos, violência, seqüestros, corrupção e afins, vemos embasbacados o relato de atrocidades cometidas contra calouros, durante os trotes universitários.
Além do choque e da revolta, sinto uma crescente indignação ao fato desses “seres” serem denominados universitários.
Na Universidade onde estudo os trotes são coibidos veementemente, sob pena de sanção disciplinar que pode chegar à expulsão. O que se observa no início do ano são ações de arrecadação de alimentos e outros donativos que são posteriormente doados a entidades do município. O Trote atroz foi há muito substituído pelo Trote solidário.
Frente as imagens de calouros queimados, espancados, chicoteados ou em coma alcoólico, me vêm dois questionamentos. O primeiro está relacionado a quebra de sonhos, a decepção. Imagine você, ou seu filho, investir anos de dedicação, estudo e abdicação em prol do ingresso em uma Instituição de Ensino conceituada, certo de ser este o caminho para o crescimento pessoal e profissional, e no primeiro dia de aula ser literalmente atacado por uma tribo de selvagens que lhe obrigam a cumprir “penas” humilhantes, o colocando em situação degradante, quando não em situação de risco a vida. Ensino Superior é isso?
Esse é o meu segundo questionamento. O que essas pessoas acreditam estar fazendo no meio acadêmico? Erroneamente e infelizmente vemos muitos jovens encararem essa nova fase da vida como uma fase de festas, namoros, badalação, noites em barzinhos, desfile de carros na frente das instituições, enfim, tudo menos o estudo, a qualificação, o desenvolvimento de habilidades e competências, a pesquisa em benefício da comunidade.
Um colega, certa feita, expôs que considerava abominável a lei que privilegia o infrator graduado em Ensino Superior, com o direito a cela especial. Ele argumentou que o simples fato da pessoa ter acesso ao conhecimento deveria lhe conferir a noção de certo e errado. Como uma pessoa pode se graduar sem ter bem claro os conceitos de ética profissional?
Essa é uma questão que envolve grande discussão. Entraríamos no campo da qualificação dos professores, da qualidade de ensino da instituição, da contemplação de tais discussões na grade curricular, porém antes de tudo, creio que esse aprendizado deve partir da própria pessoa. Sei que os professores estão dispostos a ensinar, mas será que o aluno está disposto a efetivamente aprender? Tristemente, para alguns só interessa o canudo. O pedaço de papel.
Muitas Instituições são resistentes em coibir o trote por considerarem que essa prática lhe confere grau de qualidade. Senhores, sinto muito. A qualidade do ensino não é mensurada pela concorrência de um curso. A qualidade de uma IES é medida por seus professores, por seus ambientes de ensino, pela sua estrutura educacional, pelo seu acervo bibliográfico, pela coibição do que é errado e enaltecimento do que é certo. Uma Intuição que se preza fornece aos alunos subsídios ao desenvolvimento humano, a noção básica de que os conhecimentos adquiridos devem ser aplicados em beneficio da comunidade onde vivemos. Que profissional seremos se não formos antes de tudo, seres humanos?
Universitários, a mudança social começa conosco. Nossa própria história mostra nossa força. Usemos nosso intelecto para o desenvolvimento de práticas humanistas, inteligentes, que possam ser revertidas em melhoria para a qualidade de vida.
Veterano não deve agir como animal. Calouro não é bicho. Instituição de ensino não é zoológico. E racionalidade nunca fez mal a ninguém.

Joanna Biavatti - acadêmica do curso de pedagogia